quarta-feira, 29 de junho de 2011

SEM PERDÃO NÃO EXISTE AMANHÃ

Alguém já disse que a família é o lugar dos maiores amores e dos maiores ódios. Compreensível: quem mais tem capacidade de amar, mais tem capacidade de ferir. A mão que afaga é aquela de quem ninguém se protege, e quando agride, causa dores na alma, pois toca o ponto mais profundo de nossas estruturas afetivas. Isso vale não apenas para a família nuclear: pais e filhos, mas também para as relações de amizade e parceria conjugal, por exemplo.

Em mais de vinte anos de experiência pastoral observei que poucos sofrimentos se comparam às dores próprias de relacionamentos afetivos feridos pela maldade e crueldade consciente ou inconsciente. Os males causados pelas pessoas que amamos e acreditamos que também nos amam são quase insuperáveis. O sofrimento resultado das fatalidades são acolhidos como vindos de forças cegas, aleatórias e inevitáveis. Mas a traição do cônjuge, a opressão dos pais, a ingratidão dos filhos, a rixa entre irmãos, a incompreensão do amigo, nos chegam dos lugares menos esperados: justamente no ninho onde deveríamos estar protegidos se esconde a peçonha letal.

Poucas são minhas conclusões, mas enxerguei pelo menos três aspectos dessa infeliz realidade das dores do amar e ser amado. Primeiro, percebo que a consciência da mágoa e do ressentimento nos chega inesperada, de súbito, como que vindo pronta, completa, de algum lugar. Mas quando chega nos permite enxergar uma longa história de conflitos, mal entendidos, agressões veladas, palavras e comentários infelizes, atos e atitudes danosos, que foram minando a alegria da convivência, criando ambientes de estranhamento e tensões, e promovendo distâncias abissais.

Quando nos percebemos longe das pessoas que amamos é que nos damos conta dos passos necessários para que a trilha do ressentimento fosse percorrida: um passo de cada vez, muitos deles pequenos, que na ocasião foram considerados irrelevantes, mas somados explicam as feridas profundas dos corações.

Outro aspecto das dores do amar e ser amado está no paradoxo das razões de cada uma das partes. Acostumados a pensar em termos da lógica cartesiana: 1 + 1 = 2 e B vem depois de A e antes de C, nos esquecemos que a vida não se encaixa nos padrões de causa e efeito do mundo das ciências exatas. Pessoas não são máquinas, emoções e sentimentos não são números, relacionamentos não são engrenagens. É ingenuidade acreditar que as relações afetivas podem ser enquadradas na simplicidade dos conceitos certo e errado, verdade e mentira, preto e branco. A vida é zona cinzenta, pessoas podem estar certas e erradas ao mesmo tempo, cada uma com sua razão, e a verdade de um pode ser a mentira do outro. Os sábios ensinam que “todo ponto de vista é a vista de um ponto”, e considerando que cada pessoa tem seu ponto, as cores de cada vista serão sempre ou quase sempre diferentes. Isso me leva ao terceiro aspecto.

Justamente porque as feridas dos corações resultam de uma longa história, lida de maneiras diferentes pelas pessoas envolvidas, o exercício de passar a limpo cada passo da jornada me parece inadequado para a reconciliação. Voltar no tempo para identificar os momentos cruciais da caminhada, o que é importante para um e para outro, fazer a análise das razões de cada um, buscar acordo, pedir e outorgar perdão ponto por ponto não me parece ser a melhor estratégia para a reaproximação dos corações e cura das almas.

Estou ciente das propostas terapêuticas, especialmente aquelas que sugerem a necessidade de re–significar a história e seus momentos específicos: voltar nos eventos traumáticos e dar a eles novos sentidos. Creio também na cura pela fala. Admito que a tomada de consciência e a possibilidade de uma nova consciência produzem libertações, ou, no mínimo, alívios, que de outra maneira dificilmente nos seriam possíveis. Mas por outro lado posso testemunhar quantas vezes já assisti esse filme, e o final não foi nada feliz. Minha conclusão é simples (espero que não simplória): o que faz a diferença para a experiência do perdão não é a qualidade do processo de fazer acordos a respeito dos fatos que determinaram o distanciamento, mas a atitude dos corações que buscam a reaproximação. Em outras palavras, uma coisa é olhar para o passado com a cabeça, cada um buscando convencer o outro de sua razão, e bem diferente é olhar para o outro com o coração amoroso, com o desejo verdadeiro do abraço perdido, independentemente de quem tem ou deixa de ter razão. Abraços criam espaço para acordos, mas a tentativa de celebrar acordos nem sempre termina em abraços.

Essa foi a experiência entre José e seus irmãos. Depois de longos anos de afastamento e uma triste história de competições explícitas, preferências de pai e mãe, agressões, traições e abandonos, voltam a se encontrar no Egito: a vítima em posição de poder contra seus agressores. José está diante de um dilema: fazer justiça ou abraçar. Deseja abraçar, mas não consegue deixar o passado para trás. Enquanto fala com seus irmãos sai para chorar, e seu desespero é tal que todos no palácio escutam seu pranto. Mas ao final se rende: primeiro abraça e depois discute o passado. Essa é a ordem certa. Primeiro, porque os abraços revelam a atitude dos corações, mais preocupados em se (re)aproximar do que em fazer valer seus direitos e razões. Depois, porque, no colo do abraço o passado perde força e as possibilidades de alegrias no futuro da convivência restaurada esvaziam a importância das tristezas desse passado funesto.

Quando as pessoas decidem colocar suas mágoas sobre a mesa, devem saber que manuseiam nitroglicerina pura. As palavras explodem com muita facilidade, e podem causar mais destruição do que promover restauração. Não são poucos os que se atrevem a resolver conflitos, e no processo criam outros ainda maiores, aprofundam as feridas que tentavam curar, ou mesmo ferem novamente o que estava cicatrizado. Tudo depende do coração. O encontro é ao redor de pessoas ou de problemas? A intenção é a reconciliação entre as pessoas ou a busca de soluções para os problemas? Por exemplo, quando percebo que sua dívida para comigo afastou você de mim, vou ao seu encontro em busca do pagamento da dívida ou da reaproximação afetiva? Nem sempre as duas coisas são possíveis. Infelizmente, minha experiência mostra que a maioria das pessoas prefere o ressarcimento da dívida em detrimento do abraço, o que fatalmente resulta em morte: as pessoas morrem umas para as outras e, consequentemente, as relações morrem também. A razão é óbvia: dívidas de amor são impagáveis, e somente o perdão abre os horizontes para o futuro da comunhão. Ficar analisando o caderno onde as dívidas estão anotadas e discutindo o que é justo e injusto, quem prejudicou quem e quando, pode resultar em alguma reparação de justiça, mas isso é inútil – dívidas de amor são impagáveis.

Mas o perdão tem o dia seguinte. Os que recebem perdão e abraços cuidam para não mais ferir o outro. Ainda que desobrigados pelo perdão, farão todo o possível para reparar os danos do caminho. Mas já não buscam justiça. Buscam comunhão. Já não o fazem porque se sentem culpados e querem se justificar para si mesmos ou para quem quer que seja, mas porque se percebem amados e não têm outra alternativa senão retribuir amando. As experiências de perdão que não resultam na busca do que é justo desmerecem o perdão e esvaziam sua grandeza e seu poder de curar. Perdoar é diferente de relevar. Perdoar é afirmar o amor sobre a justiça, sem jamais sacrificar o que é justo. O perdão coloca as coisas no lugar. E nos capacita a conviver com algumas coisas que jamais voltarão ao lugar de onde não deveriam ter saído. Sem perdão não existe amanhã.

Ed René Kivitz

Fonte: www.guiame.com.br

Contato: adolphosalgado@gmail.com


quinta-feira, 23 de junho de 2011

COMO ACABAR COM AS GUERRAS

PARA ESTUDO EM FAMÍLIA

Referência: Tiago 4.1-12

INTRODUÇÃO

1. As guerras são uma realidade da vida a despeito dos acordos de paz. Há não apenas guerras entre as nações. Há também guerras nas denominações, guerras dentro das famílias e guerras dentro do nosso próprio coração.

2. Tiago diz que o nosso verdadeiro problema não está fora de nós, mas dentro de nós (v. 1; Mt 15:19-20).

3. A guerra do Peloponeso, que durou 27 anos, destruiu a Grécia no ápice da grande civilização que ela havia criado como resultado da Idade de Ouro de Atenas. Roma fez da guerra uma maneira de viver mas, apenas disso, foi vencida e destruída pelos bárbaros. Na Idade Média, a guerra varreu a Europa, culminando com os horrores da Guerra dos Trinta anos, terminada em 1648. Essa guerra é considerada o episódio militar mais horrível na história ocidental antes do século XX. Cerca de 7 milhões de pessoas ou seja, 1/3 dos povos de língua alemã morreram naquela guerra.

4. Na Primeira guerra Mundial 1914-1918 aproximadamente 30 milhões de pessoas pereceram. Todos ficaram horrizados. Mas dentro de vinte anos outra guerra foi lutada no mesmo anfiteatro, pelos mesmos participantes, por muitas das mesmas razões. A Segunda guerra mundial 1939-1945 resultou na perda de 60 milhões de vidas, enquanto os custos quadruplicaram de estimativa de 340 bilhões para 1 trilhão de dólares.

5. Assistimos a guerra fria entre comunismo e o capitalismo. Assistimos o maior massacre da história contra os cristãos através do comunismo. Assistimos sangrentas guerras tribais na África. Fratricidas guerras na Irlanda. Massacres no Oriente Médio. Hoje vemos o domínio bélico da América sobre seus rivais.

6. Essas guerras são uma projeção da guerra instalada no nosso próprio peito. Carregamos uma guerra dentro de nós. Desejamos o nosso próprio prazer à custa dos outros (v. 2). Em vez de lutar, devemos orar (v. 2-3).

7. Tiago descreve três tipos de guerras que enfrentamos:

I. EM GUERRA CONTRA AS PESSOAS – V. 1,11,12.

1. O Salmo 133:1 diz: “Oh como é bom e agradável viverem unidos os irmãos!”. Certamente os irmãos deveriam viver unidos, em harmonia, mas muitas vezes, eles vivem em guerra. Os pastores de Ló entraram em contenda com os pastores de Abraão. Absalão conspirou contra o seu pai Davi. Os próprios discípulos geraram tensões entre si perguntando para Jesus quem era o maior. As vezes, os membros da igreja entravam em contendas e levavam essas guerras para os tribunais (1 Co 6:1-8). Na igreja da Galácia os crentes estavam se mordendo e se devorando (Gl 5:15). Paulo escreveu aos crentes de Éfeso para preservaram a unidade no vínculo da paz. Na igreja de Filipos duas mulheres líderes da igreja estavam em desacordo (Fp 4:1-3).

2. Tiago já havia denunciado a guerra de classes (2:1-9). Os ricos recebiam toda a atenção e os pobres eram ignorados. Tiago também denunciou a guerra entre patrões e empregados (5:1-6). Quando os ricos estavam retendo com fraude os salários dos ceifeiros. Tiago denuncia ainda a guerra dentro da igreja (1:19-20). Os crentes estavam ferindo uns aos outros com a língua e com um temperamento descontrolado. Finalmente Tiago denuncia uma guerra pessoal (4:11-12). Os crentes estavam falando mal uns dos outros e julgando uns aos outros. Nós precisamos examinar primeiro a nossa própria vida e depois ajudar os outros (Mt 7:1-5). Não somos chamados para ser juízes. Deus é o nosso juiz. Seu julgamento é justo e santo.

3. O mundo vê essas guerras dentro das denominações, dentro das igrejas, dentro das famílias e isso é uma pedra de tropeço para a evangelização. Por isso Jesus orou pela unidade (Jo 17:21). Como podemos estar em guerra uns contra os outros se pertencemos à mesma família, se confiamos no mesmo Salvador, se somos habitados pelo mesmo Espírito? A resposta de Tiago é que temos uma guerra dentro de nós.

4. Cristãos em guerra (v. 1-2b) – Tiago aborda aqui três coisas: 1) Um fato – Há guerra entre os irmãos. Essa guerra representa o contínuo estado de hostilidade e antagonismo; 2) Uma causa – Os prazeres que militam na carne. Tiago diz que os nossos desejos são como um campo armado pronto para guerrear; 3) Uma prática – A cobiça.

II. EM GUERRA CONTRA NÓS MESMOS – V. 1b-3

1. A fonte de todas essas guerras está dentro do nosso próprio coração (v. 1; 3:14,16). A essência do pecado é o egoísmo. Eva caiu porque quis ser igual a Deus. Abraão mentiu porque queria se proteger (Gn 12:10-20). Acã causou derrota a Israel porque egoisticamente tomou o que era proibido. Somos como Tiago e João, queremos lugar especial no trono.

2. Desejos egoístas são coisas perigosas. Eles levam a ações erradas (v. 2). E eles levam a orações erradas (v. 3). Quando as nossas orações são erradas, toda a nossa vida está errada. Nossas orações não são respondidas quando há guerras entre os irmãos e paixões dentro do coração.

3. Orações não respondidas – Tiago muda da nossa relação horizontal para a nossa relação vertical. Quando temos guerra com os irmãos, temos a comunhão interrompida com Deus. Enquanto a oração seria a solução (v. 2b), mas na prática a oração não funciona (v. 3a) porque ela está motivada pela mesma razão que provoca as contendas (v. 3b).

4. Não cobiçarás é o décimo e último mandamento da lei. Quebramos toda a lei quando quebramos esse mandamento. Desejo egoista e oração egoísta conduz à guerra. Se há guerra do lado de dentro, haverá guerra do lado de fora.

5. Pessoas que estão em guerra consigo mesmas, são infelizes.

III. EM GUERRA COM DEUS – V. 4-10

A raiz de toda a guera é rebelião contra Deus. Mas como um crente pode estar em guerra contra Deus? Cultivando amizade com os inimigos de Deus. Tiago cita três inimigos com quem não podemos ter amizade se desejamos viver em paz com Deus.

Tiago fala de tentações que estão fora de nós (o mundo e o diabo) e tentações que estão dentro de nós (a carne).

1. O mundo (v. 4)

O mundo aqui é a sociedade humana com seus valores, princípios, filosofia vivendo à parte de Deus. Esse sistema que rege o mundo é anti-Deus. Se o mundo valoriza a riqueza, começamos a valorizar a riqueza também. Se o mundo valoriza o prestígio, começamos a valorizar o prestígio. Temos a tendência de assimilar esses valores do mundo.

Um crente pode tornar-se amigo do mundo gradativamente: Primeiro, sendo amigo do mundo (4:4). Segundo, sendo contaminado pelo mundo (1:27). Terceiro, amando o mundo (1 Jo 2:15-17). Quarto, conformando-se com o mundo (Rm 12:2). O resultado é ser condenado com o mundo (1 Co 11:32). Então, seremos salvos como que através do fogo (1 Co 3:11-15).

Amizade com o mundo é uma espécie de adultério espiritual. O crente está casado com Cristo (Rm 7:4) e deve ser fiel a ele (Is 54:5; Jr 3:1-5; Ez 23; Os 1-2; 1 Co 11:2). O mundo é inimigo de Deus e ser amigo do mundo é constituir-se em inimigo de Deus.

Não dá para ser amigo do mundo e de Deus ao mesmo tempo.

2. A carne (v. 1,5)

A carne é a nossa velha natureza. A carne não é o corpo. O corpo não é pecaminoso. Podemos usar o corpo para gloficar a Deus ou para servir ao pecado. Na conversão recebemos uma nova natureza, mas não perdemos a velha. Ela precisa ser crucificada. Essas duas naturezas estão em conflito (Gl 5:17). É isso que Tiago diz no v. 1.

Há paixões carnais que buscam nos colocar em guerra contra Deus. Devemos fugir dessas paixões (1 Co 6:18; 2 Tm 2:22). Fugir aqui não é um gesto desprezível. José do Egito fugiu da mulher de Potifar. A única maneira de vencer as tentações da carne é fugindo. Fugir do lugar, do ambiente. Viver na carne significa entristecer o Espírito Santo que vive em nós (v.5; Ef 4:30).

O Espírito de Deus habita em nós e anseia por nós com zelo (v. 5). Ele não nos divide com ninguém. Estamos casados com Cristo. Você levaria Cristo para uma sala de jogos, para uma boate, para um show do mundo, para uma intimidade sexual fora do casamento?

3. O diabo (v. 6-7)

O mundo está em conflito com o Pai. A carne em luta contra o Espírito e o diabo se opõe ao Filho de Deus.

O pecado predileto do diabo é a vaidade, o orgulho. Ele tenta as pessoas nessa área (v. 6-7). Ele tentou Eva e tenta os novos crentes (1 Tm 3:6). Deus quer que dependamos dele enquanto o diabo quer que dependamos de nós. O diabo gosta de encher a nossa bola. O grande problema da igreja hoje é que temos muitas celebridades e poucos servos. Há tanta vaidade humana que não sobra espaço para a glória de Deus.

4. Como podemos vencer esses três inimigos?

* O caminho de uma graça maior – v. 6 – Deus está incansavelmente do nosso lado. Ele sempre nos dá graça suficiente para vencer. Mas a graça de Deus não nos isenta de responsabilidade. Nos versos 7-10 há dez mandamentos para obedecer. A graça não nos isenta da obediência. Quanto mais graça, mais obediência.

a) Submetendo-nos a Deus (v. 7)

Essa palavra é um termo militar que significa fique no seu próprio posto, ponha-se no seu lugar. Quando um soldado quer se colocar no lugar do general ele tem grandes problemas. Renda-se incondicionalmente. Ponha todas as áreas da sua vida sob a autoridade de Deus. Por isso um crente rebelde não pode viver consigo nem com os outros.

Davi pecou contra Deus, adulterando, matando Urias e escondendo o seu pecado. Mas quando ele se humilhou, se submeteu e confessou, encontrou paz novamente com Deus.

b) Resistindo ao diabo (v. 7)

O diabo não é para ser temido, mas resistido. Somente quem se submete a Deus pode resistir ao diabo. A Bíblia nos ensina a não dar lugar ao diabo (Ef 4:27).

c) Mantendo-nos perto de Deus (v. 8)

Quanto mais perto de Deus ficamos, mais parecidos com Jesus nós nos tornamos. Comunhão com Deus é uma pista de mão dupla. Quando nos chegamos a Deus, ele se chega a nós. Não podemos ter comunhão com Deus e com o pecado ao mesmo tempo (v. 8b).

Comunhão com Deus implica em purificação (v. 8b)

d) Humilhando-nos diante de Deus (v. 9-10)

Temos a tendência de tratar o nosso pecado de forma muito leva e condescendente. Tiago exorta-nos a enfrentar seriamente o nosso pecado (v. 9). A porta da exaltação é a humilhação diante de Deus (v. 10). Deus não despreza o coração quebrantado (Sl 51:17).

Deus olha para o homem que é humilde de coração e treme diante da Palavra de Deus (Is 66:2).

Quando estamos em paz com Deus, temos paz uns com os outros e uma fonte de paz jorrando de dentro de nós!

Rev. Hernandes Dias Lopes

Fonte: www.hernandesdiaslopes.com.br


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sexta-feira, 3 de junho de 2011

UM DÍVIDA DE AMOR

"Perdoa as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores" (Mateus 6:12).

Augusto Cury, médico, psiquiatra, psicoterapeuta, pós-graduado em Psicologia Social e escritor, escrevendo sobre o texto acima no seu livro " Os Segredos do Pai-Nosso 2", conta a história da vilã que se tornou heroína. Assim ele diz:

"Certa vez, P.M., um homem de 40 anos de idade, expressou para mim a raiva, indignação e repugnância que sentia ante os comportamentos de sua mãe. Ele tentara perdoá-la a vida toda e esquecer as ações dela que o feriram, mas não conseguira.
Ser refém do passado é mais difícil do que ser refém de um sequestrador, de um ambiente profissional opressor ou de um casamento conflitante. Pode-se fugir do cativeiro, mudar de emprego e divorciar-se, mas ninguém consegue escapar de si mesmo. Por mais que P.M. se esforçasse, as mágoas permaneciam e as imagens do passado o assombravam.
Ele era prisioneiro de suas janelas killer (zona de conflito no inconsciente). Como não tinha sensibilidade para interpretar os comportamentos da mãe, qualquer coisa que ela fizesse o desapontava. Era impaciente, intolerante e injusto com ela. Mas tinha receio de tocar nas causas que alimentavam sua relação fragmentada.
É impossível enterrar um passado não resolvido. É preciso enfrentá-lo para livrar-se do fantasma que assombra e controla. Consciente disso, P.M. decidiu começar a fazer um inventário da sua história. Aos poucos tomou coragem para entrar nos vales amargos das suas frustrações, dissecar as artérias principais da sua infância e falar sobre ela.
Seu pai abandonara sua mãe quando ele era pequeno. Isso lhe causara uma grave ruptura. Mas o drama não parou aí. Sem profissão com que pudesse garantir seu sustento e o do filho, a mãe começou a se prostituir. P.M. viu muitas vezes homens entrarem na intimidade do quarto da mãe e ouviu os sussurros da relação sexual. Aqueles sons construíram zonas de confritos no seu inconsciente. Tinha vontade de matar todos. Sentia-se vítima de um pai carrasco, de uma mãe vilã e de homens estranhos que violavam seu mundo sem pedir licença.
Ao resgatar a dolorosa história e começar a repensá-la, P.M. deixou de se posicionar como o um miserável abandonado pela sociedade e por si mesmo. Passo a passo, começou a aprender a interpretar a história de sua mãe através dos olhos dela, a partir das dificuldades que ela enfrentara.
Ao olhar sob essa perspectiva, foi sentindo compaixão e solidariedade. Aos poucos começou a entender por que todos os seus esforços para perdoar a mãe não funcionaram.
Ao longo do tempo, P.M. melhorou, mas não o suficiente. Filho e mãe ainda estavam muito distantes, famintos de aproximação. Para isso, precisavam romper barreiras, rasgar a alma, ter um encontro solene um com o outro.
Como tocar no assunto? Era constrangedor, mas necessário. P.M. não podia atuar como juiz da mãe e não possuía nenhum elemento concreto para ser seu advogado de defesa. Ele é que se sentia vítima de um passado cáustico, frio, seco, que não tinha escolhido.
Não era possível abandonar suas frustrações, mas era necessário administrá-las para poder falar sem acusar a mãe. Certo dia tomou coragem e procurou-a, dizendo que precisava ter um diálogo aberto que seria muito importante para o futuro dos dois.
Ela aceitou. Pela primeira vez falaram sobre um passado dilacerante e intocável. O tempo parou, lágrimas copiosas de uma mãe machucada e de um filho ferido percorreram os vincos dos rostos, procurando encontrar um oceano de paz.
Foi um diálogo transparente, afetuoso e regado a compreensão. Enquanto penetravam nas entranhas de suas histórias, o fenômeno RAM (registro automático da memória) ia arquivando essa experiência nos locos das janelas killer (zona de conflitos do inconsciente). É impossível apagar o passado, mas ele foi reeditado, reescrito, vivenciado de uma nova forma. Não seria esquecido, mas não perturbaria mais da mesma forma.
Quando o filho falou dos homens estranhos que entravam no quarto da mãe, dos sussurros que ouvia e do ódio que sentia, a mulher caiu em prantos. Com a voz embargada, tocou pela primeira vez no assunto. Disse-lhe que violentara seus valores, esmagara sua auto-estima e se prostituíra para não vê-lo passar fome. "Meu filho, enquanto me prostituí
a
, eu chorava por dentro, mas você era mais importante para mim".
Foi a vez de o filho chorar copiosamente. Diante dele estava uma mulher com quem ele convivia, mas que não conhecia. Só depois de se nutrir do diálogo, da segurança, da humildade e da transparência passou a conhecer a mãe. Décadas de dor poderiam ter sido evitadas se ele tivesse se nutrido antes. Mas nunca é tarde para recomeçar.
Percebeu que tinha com a mãe uma dívida que nunca saudara, uma dívida de amor. A vilã se tornou heroína. A mulher frágil passou a ser vista como forte. A mulher de quem o filho tinha vergonha passou a ser motivo de orgulho. Mãe e filho se descobriram e se perdoaram.
A grande maioria das famílias modernas se tornou um grupo de estranhos. Poucos de seus membros se conhecem em profundidade, embora sejam excelentes para tachar, julgar, criticar, apontar erros. Dizem amar-se uns aos outros, mas não sabem dialogar, expressar afeto, solidariedade, tocar a vida com confiança. Estão famintos e endividados.
Por trás de atitudes interpretadas com repugnâncias pode estar escondido um amor sublime que só olhos que penetram além dos comportamentos visíveis são capazes de enxergar. É preciso nutrir o psique para traduzir o invisível".

Augusto Cury. Trecho do livro " A sabedoria nossa de cada dia - Os segredos do Pai-Nosso - 2

Contato: adolpho Salgado